O Futebol "não" popular - Universidade do Futebol

O futebol, alegria do povo, já não é mais popular
A prática de arrendamento de estádios municipais está provocando o aumento dos ingressos e regras de comportamento do torcedor
Por Roberto Amado*
O futebol no Rio de Janeiro nunca mais será o mesmo — e o modelo pode predominar no resto do país. De carona no "padrão Fifa de qualidade", o Maracanã, o único estádio do Estado capaz de abrigar grandes públicos, foi reformado, arrendado e agora está subjugado a novas regras de negócio e comportamento. A elitização é inevitável.
Depois da reforma para a Copa do Mundo, em que foram gastos mais de 1 bilhão de reais, o Maracanã foi arrendado pelo consórcio Complexo Maracanã Entretenimento S.A, formado pela Odebrecht, IMX e AEG, por 35 anos. Durante esse prazo o consórcio terá que pagar R$ 5,5 milhões por ano e investir R$ 594 milhões em obras no entorno — e pretende faturar, líquido, mais de R$ 1 bilhão.
Mas, tem direito a estabelecer as regras de uso. Assim, o consórcio acaba de fechar um negócio com o Fluminense, que deverá mandar seus jogos no estádio pelos próximos 35 anos. Segundo o acordo, o clube não terá que pagar "nada", mas só poderá faturar com a venda de 43 mil ingressos, correspondentes a 56% da capacidade no Maracanã. São os piores lugares. Os melhores e que dão mais lucros, como os camarotes vendidos a empresas, são do consórcio — e a empresa já estabeleceu que o preço mínimo dos ingressos será de R$ 100.
Mais do que isso, vai divulgar, em breve, um Termo de Ajuste de Conduta, estabelecendo regras para a torcida que frequentar o estádio. Nelas, estão previstas a proibição de instrumentos musicais e o hábito carioca de assistir aos jogos sem camisa — além de limitar o tamanho das bandeiras. O consórcio quer cobrar caro e só ter "gente fina" no estádio.
O negócio não agradou ao Flamengo que, sem estádio, vai perambular pelo Brasil afora para mandar seus jogos no Campeonato Brasileiro. Principalmente em Brasília, no estádio Mané Garrincha, cujo consórcio gestor (formado pela Andrade Gutierrez e Via Engenharia) oferece condições melhores nas negociações.
Estão, na verdade, caçando times para jogar no estádio que foi construído para a Copa do Mundo e que promete ficar às moscas. O Botafogo deverá fazer um acordo de curta duração porque pretende mandar seus jogos no Engenhão, depois que for reformado.
O arrendamento dos estádios municipais é uma realidade aparentemente inevitável — e com ele a elitização definitiva. Há ainda resistências, mas baseadas exclusivamente nas condições das negociações. O Atlético Mineiro, por exemplo, recusa-se a jogar no Mineirão, arrendado pelo Consórcio Minas Arena S.A. (Construcap, Egesa e Hap) porque concluiu que irá "sustentar a empresa gestora", segundo seu presidente Alexandre Kalil.
O Cruzeiro fechou negócio com o consórcio, mas já está em vias de quebrar o contrato por ter concluído que só poderá ter lucro a partir de 10 mil pagantes por jogo.
Uma realidade muito diferente do passado, quando os clubes pagavam taxas de uso dos estádio municipais referentes apenas aos custos, sem precisar gerar lucros para empresas gestoras. O Maracanã, por exemplo, cobrava de 20 a 40 mil reais por jogo, dependendo da importância do evento.
A privatização dos negócios do estádio leva a uma majoração nos preços dos ingressos e, em consequência, à necessidade de oferecer confortos a um público mais exigente. Em outras palavras, uma "europeização" do futebol.
"Os consórcios olham para uma operação europeia que ainda não chegou.Impor o padrão Fifa inviabiliza o futebol no Brasil", diz o diretor-executivo do Botafogo.

*Roberto Amado é jornalista e editor do site Poucas Palavras

No Clima do Natal - Papai Noel Espanhol

Papai Noel espanhol
Por Guilherme Costa - Universidade do Futebol
Bayern deu uma aula de comunicação ao contratar Guardiola. Guardiola tem dado aulas de comunicação ao transformar o estilo e a postura do Bayern
24/12/2013

Thiago Alcântara é filho de brasileiro, mas nasceu na Itália e defende a seleção da Espanha, país em que se formou como jogador de futebol. Defende atualmente um time alemão, o Bayern de Munique, que conquistou no último sábado, no Marrocos, o título mundial de clubes da Fifa. Primogênito de Mazinho, campeão da Copa de 1994, o camisa 6 é um resumo da globalização do futebol atual. Mas também é uma aula constante de vários conceitos que nós discutimos por aqui durante o ano.
Contratado para esta temporada, Thiago Alcântara fez um movimento curioso. Deixou o Barcelona, time em que era uma das maiores apostas para o futuro. Deixou um ambiente que ele conhecia e dominava desde as categorias de base. Deixou uma torcida afeiçoada ao estilo de jogo dele.
A adição de Thiago ao elenco do Bayern de Munique, que havia conquistado na temporada anterior a Copa da Alemanha, o Campeonato Alemão e a Liga dos Campeões da Uefa, foi um pedido de Pep Guardiola, espanhol que assumiu o time exatamente depois da tríplice coroa.
Assim como Thiago, Guardiola é egresso do Barcelona. Ambos foram formados de acordo com a filosofia de jogo do time catalão. Ambos veem futebol como o time espanhol os acostumou a enxergar.
O Bayern não contratou Guardiola apenas para ter sucesso esportivo. Para isso, seria mais simples manter o time vencedor, veloz e mortal da temporada passada. A equipe alemã percorria caminhos mais curtos para as vitórias.
A contratação de Guardiola tem a ver com a mensagem que o Bayern de Munique quer transmitir. Mais do que vencer, o time alemão assumiu o desafio de assimilar a filosofia do treinador: controle do jogo, domínio da bola e encantamento produzido pelo coletivo.
O Bayern de Munique não se tornou no Marrocos o melhor time do mundo. Os alemães são os melhores do mundo desde o término da temporada passada.
Aí começam a entrar alguns conceitos fundamentais de comunicação. Em primeiro lugar, a visão da diretoria da equipe alemã: o Bayern não se acomodou e não se contentou com o êxito. A cúpula quis construir um time que transmitisse mensagens e que produzisse um impacto em quem vê. Hoje em dia, é impossível passar incólume por um jogo dos bávaros.
Outro ponto é a postura de Guardiola. O treinador foi questionado no início, até mesmo por jogadores. Bastian Schweinsteiger chegou a dizer que não sabia em que posição ele atuava.
Guardiola montou um Bayern que joga no 4-1-4-1 na maior parte do tempo, mas que tem liberdade. E é extremamente complicado convencer um jogador de futebol a aproveitar a liberdade.
Num esporte mecanizado, moldado desde cedo por conceitos tecnicistas, jogadores não costumam pensar. Resolvem problemas, mas fazem isso de forma empírica. Improvisam, mas fazem isso por pura necessidade.
O Bayern de Guardiola subverte isso. É um time que controla a bola, que usa uma movimentação intensa e que oferece liberdade para os jogadores. São conceitos simples, mas extremamente raros.
Guardiola merece um elogio a mais. O treinador pode não vencer nada, mas em momento algum abriu mão de suas convicções. Montou o Bayern com características que ele havia impingido ao Barcelona. O time alemão lidera com folga a Bundesliga e se classificou com facilidade para a fase decisiva da Liga dos Campeões da Uefa.
Aqui é fundamental uma lembrança: um treinador novato, que tinha apenas uma experiência na profissão, precisou convencer a equipe que tinha vencido tudo na temporada anterior a mudar tudo. Ele precisou mostrar a um grupo inteiro que vencer não era tudo.
O Bayern deu uma aula de comunicação ao contratar Guardiola. Guardiola tem dado aulas de comunicação ao transformar o estilo e a postura do Bayern.
E onde entra o meio-campista Thiago Alcântara nessa discussão?
Thiago simboliza o que Guardiola pensa de futebol. É um jogador refinado, que toca a bola sem pressa e que tem autossuficiência. Ele sabe o quanto domina o jogo, o que o ajuda a ousar em passes e finalizações.
É difícil dizer a posição de Thiago Alcântara. Ele não é um volante, tampouco um meia. É um armador, mas um armador que atua sempre de frente para o jogo.
No Brasil, Thiago provavelmente teria de escolher entre as duas opções. Teria de se acostumar a jogar de costas para o gol, protegendo a bola até o time se movimentar, como fazem os meias. Ou então marcar, fechar espaços nas laterais e reduzir as investidas ao ataque, como fazem os volantes.
Ele não escolheu nenhuma das coisas. Escolheu ser um armador que percorre a zona intermediária do campo, assim como Xavi. Dono do passe mais perfeito do futebol mundial há muitos anos, o espanhol é subvalorizado porque não é um goleador ou um definidor de lances. Mas ele é a principal razão de o Barcelona e a seleção espanhola terem o perfil que têm.
A visão de futebol de Thiago é moderna e extremamente alinhada ao que Guardiola preconiza.
Aí está mais uma lição de comunicação do Bayern: o time tem objetivos claros, que são construídos por pessoas que estão alinhadas a essas estratégias.
Repito: o time alemão pode não vencer tanto quanto o anterior. Futebol, afinal, é um jogo.
Independentemente disso, porém, o Bayern já atingiu feitos nesta temporada. Na comunicação, principalmente.

Inversão de Valores - Universidade do Futebol

O presente artigo retrata a inversão de valores e os desdobramentos que isso causa no esporte.
Por Cezar Tegon.

Inversão de Valores
Quando ser bom se torna ruim
Desde os primórdios, para sobreviver e evoluir em nosso planeta os seres vivos precisam se esforçar. Dessa forma, sobrevivem os que lutam com mais garra, os que aprendem mais rápido e são mais adaptados, os que exercitam suas habilidades e usam suas experiências para melhorar etc. No mundo natural, esta lógica continua válida, ou seja, esta é a conduta que leva qualquer espécie a alcançar o sucesso.
No entanto, na vida prática das pessoas, tenho visto esta lógica ser desafiada dia a dia. Em um tempo não muito distante, observávamos os mais esforçados sobressaírem-se. Os que nasciam com algum talento e que eram dedicados e perseverantes eram reconhecidos como gênios e outros com menos talento - mas não menos dedicação - eram reconhecidos como guerreiros.
O que tinham em comum os gênios e guerreiros? Ambos recebiam seus “prêmios” pelo esforço e perseverança e, por esta razão, ocupavam posições de destaque na vida. Esses eram os líderes de comunidades, comandavam tribos, controlavam a produção, enfim, eram pessoas admiradas.
Dentro desta lógica podemos concluir que o funcionário mais esforçado é valorizado e serve de inspiração aos outros, o estudante mais dedicado é a referência da turma, o atleta mais comprometido e aplicado é reconhecido pelo público. Obvio e certo, não é? Não!
Hoje, no campo das atividades humanas, esta lógica vem se invertendo radicalmente, seja em empresas, ambientes de ensino, clubes esportivos ou outras instituições.
Hoje o funcionário mais dedicado e comprometido virou o chato, “puxa-saco” dos superiores, o aluno dedicado que deveria ser a referência da turma virou o nerd, "CDF" e o atleta mais aplicado virou o “vilão”, pois faz elevar o nível de exigência dos outros membros do grupo.
Tenho certeza que, ao lerem esses exemplos, automaticamente se lembrarão de pessoas bem próximas, que ao invés de serem admirados e servirem como referências como acontecia no passado, hoje são taxados por adjetivos pejorativos. Esses acabam, muitas vezes, até excluídos de seus grupos e privados das oportunidades que fariam jus pela ordem natural das coisas.
Para ficar mais claro, dou dois exemplos de pessoas públicas que atuam no esporte e que pagam um preço alto por serem muito dedicados e, acima da média, são fatos recentes e que mostram claramente esta realidade:
1) Um é o Tite, técnico do Corinthians. Trata-se de um profissional vencedor, que permaneceria em qualquer clube da Europa por muito tempo. No entanto, não teve seu contrato renovado com a justificativa de que o clube precisa "reciclar o ambiente". Na verdade, ele trabalha muito e incomoda muita gente, então criaram um motivo!
2) Outro exemplo é o Rogério Ceni, lendário goleiro do São Paulo. Ele acaba de estabelecer a marca de 1.117 jogos pelo clube, um recorde mundial. Alguém que deveria ser orgulho para o nosso esporte, é taxado como "fominha" que joga até amistoso, que não quer ficar de fora nunca. Isso é ruim? Claro que não, isso é ótimo, mas não para os dias de hoje!
É fácil entender porque estas coisas acontecem não só em clubes de futebol mas também nas empresas, por isso divido com vocês minha visão sobre o tema:
Excluindo quem se destaca, automaticamente o nível fica mais baixo e todos ficam mais confortáveis, sendo mais simples justificar as incompetência e a falta de esforço.
Esta é uma atitude natural de auto-preservação da incompetência, que limita a evolução em todos os sentidos e claro isso afeta empresas, educação, esporte e todos os segmentos onde se pratique essa "barbárie" de comportamento.
No caso de nossos exemplos, vale lembrar que o Tite ganhou a Libertadores, o Mundial de Clubes, a Recopa, o Campeonato Brasileiro entre outros. O Ceni fez mais de 1.117 jogos pelo seu São Paulo e, mesmo sendo goleiro, fez mais de 100 gols.
Ser reconhecido é um desejo natural, mas lembro que para atingir resultados diferenciados ambos tiveram que abdicar de muitos prazeres da vida para se destacarem em suas profissões.
Recompensar de maneira diferenciada os mais esforçados, acreditem, é a ordem natural das coisas. Tanto que as empresas descobriram que as pessoas ficam mais felizes quando existe meritocracia, que significa simplesmente valorizar quem se destaca, quem se esforça mais.
A boa notícia é que, mesmo com essa inversão de valores, noto que quem se esforça, tem vontade e perseverança, trabalha com amor, é curioso e estudioso acaba se destacando entre tantos outros indivíduos. Para os demais, os que não se esforçam, restará continuar se lamentando e criticando quem faz acontecer.
Escolha de que lado prefere estar. Reflita sobre isso e lembre-se que você pode fazer a diferença sempre!

*Cezar Antonio Tegon é graduado em Estudos Sociais, Administração de Empresas e Direito. É Presidente da Elancers e Sócio Diretor da Consultants Group by Tegon. Com experiência de 30 anos na área de RH, é pioneiro no Brasil em construção e implementação de soluções informatizadas para RH. Palestrante em vários congressos e universidades sobre temas relacionados à Gestão de Pessoas, Tecnologia da Informação e Perfil Comportamental.

Nota BOM SENSO F.C. à CBF

CARTA ABERTA À CBF

Caro Presidente,

Talvez o senhor não saiba, mas não somos apenas um grupo de jogadores. Somos mais de 1000 (mil), reunidos em apenas três meses, em prol de um futebol melhor para todos.

Um grupo democrático, onde todos os envolvidos têm poder de votar, opinar e participar. Sabemos que o senhor não está acostumado com essa tal democracia e até entendemos que seja difícil se adaptar, faz pouco tempo...

O senhor tem razão quando diz que existe um calendário permanente desde 2003. E um calendário ruim desde então. Porque antes disso ele era péssimo.

Mas o senhor conseguiu resolver todos os problemas do calendário do dia para a noite. Foi só limitar o número de jogos dos jogadores e não dos clubes e pronto, eis que melhoraremos a qualidade no espetáculo. Ou seja, a saída escolhida é o mesmo que encontrar um burro dentro de sua sala e pedir para trocarem o sofá, pois algo lhe parece estranho.

Não nos diga que o senhor tem orgulho do calendário de apenas quatro meses de competição para a maioria dos clubes do Brasil. Talvez o senhor dê pulos de alegria quando vê a formula de disputa do Campeonato Paulista de 2014, que pode fazer com que um time seja campeão e rebaixado ao mesmo torneio.

Desconfiamos até que o êxtase o atinja quando o senhor percebe a extraordinária estratégia de um time precisar ser desclassificado de uma competição nacional (Copa do Brasil) para se classificar para um torneio internacional (Copa Sul-Americana).

Quanta genialidade! Responda-nos uma coisa: É justo que os times percam seus melhores jogadores quando há partidas das seleções simplesmente porque o campeonato daqui não para nas datas FIFA?

Responder não parece ser seu forte, não é mesmo?

Inclusive, esse "grupo de meia dúzia de jogadores" deve ser muito chato mesmo para exigir explicações tão "complicadas".

De qualquer forma, e apesar de tudo, foi importante o senhor ter falado das Séries C e D e ressaltar a boa ação da CBF com essas duas competições. Mas veja, caro presidente, a fonte de receita da CBF é a Seleção Brasileira, fruto final do futebol jogado no país. Logo, usar parte desses recursos para subsidiar as competições para as quais a confederação não consegue receita não é caridade, é uma simples obrigação. Afinal, assim como os direitos sobre a NOSSA Seleção são da CBF, os deveres sobre o futebol brasileiro também devem ser.

Só para lembrá-lo, é graças à grandeza do futebol brasileiro, construída por clubes e jogadores nos últimos 100 anos, que a CBF possui hoje, 14 legítimos patrocinadores. Logo, não basta cuidar apenas da Seleção, é preciso regar a raiz do nosso futebol.

Outra coisa. Talvez o senhor não tenha lido, mas já falamos abertamente sobre os salários do futebol. E temos certeza de que o Fair Play Financeiro implementado de forma eficaz (não aquele de faz de conta da FPF) irá diminuir os salários. E mesmo cortando na nossa própria carne, continuaremos lutando pelo bem do futebol. Porque quem regula o salário pago aos jogadores é o mercado e se o gestor for obrigado a gastar apenas o que o clube arrecada, pagará menos a todos. O que gera salários astronômicos (e atrasados) é a falta de um dispositivo punitivo (esportivo e civil) a quem gasta mais do que ganha.

Mas isso é encrenca política demais para alguém assumir em ano de eleição, não é?

E para ajudar o Bom Senso FC a virar consenso de uma vez por todas, o Campeonato Brasileiro terminou de forma melancólica, dentro do tribunal! A frase: "Tu és eternamente responsável por aquilo que cativas" não poderia se encaixar melhor nessa situação. A justiça desportiva se torna protagonista e o resultado de campo fica para trás. Sem discutir o mérito de quem está certo ou errado, a conclusão final é de que a CBF é que deveria ir para a segunda, terceira, quarta divisão.

No fundo e para finalizar, a nossa expectativa é que a CBF, que se denomina entidade maior do futebol brasileiro, realmente assuma o seu papel de gestora do nosso esporte e participe do debate jogando, atuando, e não apenas assistindo.

E antes que nos perguntem, as férias têm nos feito muito bem.

Em janeiro nos vemos por aí. Boas Festas!

Bom Senso Futebol Clube

Por um futebol melhor
para quem joga,
para quem torce,
para quem apita,
para quem transmite,
para quem patrocina.

Por um futebol melhor para todos.

Copa do Mundo e Olimpíada: Os cartéis mandam no jogo

Segue abaixo a entrevista, transcrita, do Professor Paulo Capela sobre os cartéis referentes à Copa do Mundo e Olimpíada, ou seja, os valores referentes as construções da Copa e da Olimpíada.

Copa do Mundo e Olimpíada: Os cartéis mandam no jogo

O Professor Paulo Capela é membro do IELA e um dos coordenadores do Vitral – Observatório Latino-Americano de Educação Física, Esporte e Saúde/ CDS/UFSC . Ele participou de uma pesquisa que fez um comparativo entre os custos de construção de estádios no Brasil para a Copa de 2014 e do mesmo evento ocorrido na África do Sul em 2010. “Uma lição vinda da África do Sul”. Confira o papo.

André Lobão: Como foi a sua pesquisa sobre a Copa do Mundo e os grandes eventos esportivos no Brasil e qual a relação deles com que aconteceu na África do Sul durante a realização da copa de 2010, quando ocorreram problemas de acréscimo nos custos de construção dos equipamentos e infraestrutura?

Paulo Capela: Desde 2005,  a gente começou a perceber que esse movimento de trazer esses megaeventos para o nosso país é antipopular, e daí nós começamos a nos organizar. Nesse momento, essa nossa relação com a África do Sul é uma ação de todo um gigantesco movimento que fazemos a partir da universidade que trabalho (UFSC), no sentido de esclarecer nossa população e as demais populações do planeta sobre esse modelo FIFA-COI de promover eventos pelo mundo afora. Queremos mostrar que isso é uma apropriação econômica-capitalista, antipopular dos esportes cujo tema é apenas uma cereja do bolo. O fascínio que o esporte produz sobre as populações faz com que eles se aproveitem disso para fazer, digamos, grandes saques econômicos sobre os países que sediam esses eventos. Então, esse é o eixo que faz com que a gente se aproxime de pesquisadores da África do Sul. Nós começamos uma interlocução com o Eddie Cottle, um pesquisador, que foi uma pessoa muito ativa na organização de 70 mil trabalhadores sul-africanos através do slogan “Salário digno para os construtores da infraestrutura da Copa do Mundo”. Ele nos visitou em abril de 2013, proferindo uma conferência junto às Jornadas Bolivarianas que é o principal evento anual do Instituto de Estudos Bolivarianos, o IELA. O Eddie Cottle voltou depois em julho para disponibilizar a tecnologia utilizada para desvelar esse evento econômico que produziu muito dano na África do Sul. Daí, neste momento, começamos uma pesquisa para saber como está se materializando essa questão aqui no Brasil. E, então partimos de alguns pressupostos que os sul-africanos já tinham acumulado.


A primeira coisa que começamos entender é que existe um grande cartel mundial da construção civil e da madeira, a partir disso ele nos traz alguns indicativos. Foi levantado pelo comitê de concorrência e organização, que é um órgão de cooperação e desenvolvimento da África do Sul, a existência de um cartel do cimento. Existe também uma pratica histórica da construção civil de promover carteis, superfaturamentos, comprar funcionários públicos e colocar dinheiro cobrado a mais em contas pelo mundo afora. E aí percebemos que está acontecendo à mesma coisa aqui no Brasil a partir dessa nossa pesquisa. Então, esse é o pano de fundo. Nós observamos que é uma pratica comum da FIFA, quando o país sede ganha o evento, divulgar para a população que o custo desse evento vai ser um, mas acaba depois sendo anunciado um valor muito superior. Por exemplo, na África esse valor em 2010 foi dez vezes o valor acima do indicado, quando do contrato assinado como país-sede. E no Brasil, essa história está se repetindo. Nós fizemos um levantamento sobre o custo das arenas que identificou que elas já estão três vezes e meia mais caras do que ao primeiro custo anunciado no momento da assinatura dos contratos.

André Lobão: Quando a FIFA começa a operar um contrato com um país - sede, ela traz nesse bojo todo um círculo de escritórios de arquitetura, fornecedores, entre outras empresas indicadas como especializada, a sua pesquisa aborda essa questão?

Paulo Capela: Nós podemos levantar duas questões. Primeiro: existe uma expectativa que vá se gerar um fato econômico que pode beneficiar o país-sede, no caso o Brasil, e isso não é verdade. Nesse pacote que eles encaminham aos congressos nacionais dos países é proposta uma legislação própria em que se cria um estado de exceção. Esse estado gera para essas empresas que participam desse conluio uma série de isenções fiscais, ou seja, elas entram em um sistema fiscal diferenciado e ameno. Então, o país perde receitas com as obras que acontecem. O segundo ponto é que todas essas obras, e aí estamos começando a investigar é que nesse pacote, vêm essas empresas que entram nesses países-sede e que elas detêm uma determinada tecnologia. É alegado que essa tecnologia é a adequada para a construção daqueles equipamentos arquitetônicos, e aí nesse momento chegam as empresas que são multinacionais. No caso do Brasil e da África do Sul são empresas de construção. São de países europeus como Alemanha, Itália, França e Holanda. Essas empresas como detêm essa tecnologia, que teoricamente apontam que não existe equivalência em nosso país de equipamentos, acabam por fazer obras superfaturadas. Então, se você pegar o equivalente a uma obra dessa realizada no Brasil elas chegam a custar 3,4 vezes o preço que custariam se fossem executadas por empresas daqui. Daí eles trazem essas empresas, superfaturamento, deslegitimam as tecnologias do nosso país, e ainda são beneficiadas com isenção de impostos. Quer dizer: o país não ganha, o estado brasileiro não ganha, e também o povo não ganha de forma nenhuma. E, por fim, não há uma transferência de tecnologia nesse processo..

André Lobão: O consórcio é um disfarce do cartel?

Paulo Capela: Os consórcios são sim cartéis disfarçados, e essa é uma prática muito comum. As empresas se reúnem em escritórios que não são espaços públicos, e definem quem vai fazer tal e qual obra. E a partir disso, as licitações quase que são direcionadas para empresas que têm essa pratica de cartel. Eles simplesmente se revezam em tal obra, naquela que tem um valor um pouco superior, e em outra  com um preço pouquinho abaixo. Então, eles vão combinando entre si qual é que vai ser a ganhadora da obra com esse superfaturamento. Desta forma, essa pratica de cartel toma uma vultuosidade muito maior do que acontece normalmente em nosso país.

André Lobão: No Rio de Janeiro esse tema está sendo bem discutido. Você sabe que o Maracanã passou por três grandes reformas e o custo total disso deve chegar a dois bilhões de reais. Além disso, temos o caso da construtora Odebrecht que em consórcios está participando em 10 empreendimentos, tendo inclusive participado do consórcio que reformou o Maracanã e agora participa de outro de concessão que administra o novo estádio. Qual a sua avaliação em relação a essa situação?

Paulo Capela: Isso é uma imoralidade. A empresa já ganha o financiamento público, ganha a concessão por 35 anos. Eles ganharam essa licitação tendo que pagar aproximadamente um bilhão de reais em parcelas, mas eles tem projeções que  esse equipamento vai gerar aproximadamente 14 bilhões. Isso significa, mais ou menos, que você recebe um financiamento. O governo dá gratuitamente para 10 mil trabalhadores, o equivalente a 50 mil reais para que eles construam sua própria casa. E aí o governo diz para eles: Vocês têm essa casa e agora podem por 35 anos alugar essas casas por um aluguel de 1.500 reais e diz que eles podem ficar com esse dinheiro. Então, observe a irracionalidade desse calculo econômico feito nessa concessão do estado para apenas uma empresa, isso é uma imoralidade. Distribui dinheiro público dos trabalhadores para as grandes empreiteiras, cuja função social seria de estar a serviço das obras estruturantes do estado, com seus devidos lucros, absolutamente determinados, no que eles fazem como função que é de serem construtoras civis, e não saquear o estado, como está acontecendo. Eles não têm konw how nenhum de como fazer a gestão de um equipamento público de esporte e lazer. Aquilo não é um shopping. É sim um equipamento público de esporte e lazer. No Brasil, existe o maior acumulo de discussão no campo dos trabalhadores sobre políticas de esporte e lazer, e com certeza não seria esse modelo de gestão que nós estaríamos oferecendo para a população do Rio de Janeiro.

André Lobão: Prof. Paulo podemos ter uma ideia do custo total do que está sendo feito no Brasil em termos de estádios e de toda essa infraestrutura que está sendo renovada?

Paulo Capela: Olha André nós temos estimativas. Como nós afirmamos no primeiro relatório produzido, estamos com dificuldades de levantar esses dados. É engraçado que no Brasil se fala muito em transparência, mas ela não é praticada. Então, estamos com muita dificuldade em ter dados concretos, mas existem estimativas que o custo final entre Copa do Mundo e Olimpíada, dadas por alguns economistas e empresas de consultoria, que isso gere um impacto direto e indireto de 112 bilhões de reais. Esse é o volume a ser gerado pela movimentação financeira. É obvio que isso aí move muito interesses. Estudos realizados indicam que um megaevento como esse mobiliza 1% do PIB do país. Então esses números indicam uma equivalência, mesmo que o governo diga que o valor é de 28 bilhões de reais. O interessante é que quando foi assinado o contrato da Copa do Mundo foi anunciado pelo Ricardo Teixeira (ex-presidente da CBF) que não haveria verbas públicas no processo. Hoje já existe um levantamento de que 75% dos valores envolvidos na construção dos equipamentos e das arenas são de fundo público. E de fundo público já sabemos qual é a tradição de devolução de dinheiro contratado por essas históricas empreiteiras no país.

André Lobão: No caso, esse dinheiro não vai ser só embolsado pelas empreiteiras, não é?

Paulo Capela: Olha, vão para vários setores conforme afirmam estudos oficiais para tentar mostrar, enquanto negócio, o que isso representa para todo o setor do nosso país. Desse jeito as empresas podem reposicionar os seus projetos frente a esses grandes recursos, circulando em uma grande janela de oportunidades, em um espaço de tempo muito pequeno.

André Lobão: Na pesquisa em que você participou existe uma atenção ao Rio de Janeiro, por conta da próxima Olimpíada?

Paulo Capela: Não fizemos nada em específico em relação ao Rio de Janeiro. Mas ouso dizer algumas coisas. Primeiro: Eu acredito que a gente não muda uma determinada sociologia que existe em nosso país que é a seguinte: o centro do poder fica em Brasília, a chave do cofre em São Paulo, e a produção de conteúdo cultural colonizador é no Rio de Janeiro. Esse modelo de sociologia em nosso país não sai desse padrão. O Rio de Janeiro está sendo reformatado para se tornar uma cidade mundial, com todas as características de uma cidade mundial, que não corresponde a estruturação de um tecido social popular que tem essa cidade. Ela vai sendo reconstruída para ser uma cidade de turismo histórico, de negócios e eventos. Agora, a perversidade desse modelo de cidade mundial, é que ela está sendo criada para a classe média alta, para os endinheirados do mundo, e não para as pessoas que desejam conhecer sua realidade profunda. A segunda perversidade nessa cidade é que não há moradia para os trabalhadores e as pessoas mais humildes e simples. Nós estamos dolorosamente vendo o sofrimento das pessoas que fazem do Rio de Janeiro o que ele é; uma cidade linda maravilhosa, uma expressão da forma de ser brasileiro. Então, isso está sendo absolutamente maquiado com o sofrimento da população. Uma população de trabalhadores que vai continuar sendo apartada como é hoje nas favelas. Essas pessoas que mandam no mundo, que produzem esses modelos de megaeventos e essas cidades só não conseguiram resolver uma equação: onde é que eles colocam essas pessoas trabalhadoras que fazem essa cidade?   

André Lobão: Prof. Capela e o trabalho do IELA, como é desenvolvido?

Paulo Capela: O Instituto de Estudos Latino Americanos, o IELA, tem como principio universitário produzir um pensamento próprio original e descolonizado. O Brasil tem sido formatado a partir das ideias eurocêntricas e americanas, e sabemos muito pouco sobre a própria América Latina. O IELA faz uma cruzada incansável para divulgar o horizonte a ser reconstruído a partir de novas teorias.

André Lobão: Essa parceria com os pesquisadores da África do Sul vai gerar mais alguma coisa em termos da realização de outras pesquisas?

Paulo Capela: Bom, nesse momento de megaeventos esportivos, a parceria feita com pesquisadores da África do Sul acabou por derivar outros projetos. Neste mês de dezembro será lançado um livro que retrata tudo isso que conversarmos nesta entrevista com uma análise sobre os megaeventos esportivos.  Também em janeiro de 2014, será lançado um livro produzido por 15 pesquisadores sul-africanos. Ele traz uma pauta bem interessante para entendermos o que está acontecendo no Rio de Janeiro e Brasil. O título é: ‘Copa do Mundo 2010: África do Sul, legados para quem?’, organizado pelo Eddie Cottle. É necessário que no Brasil surjam movimentos contra essa forma de organizar os povos a partir de eventos como a Copa do Mundo, Olimpíada, FIFA e Comitê Olímpico Internacional. Não é assim que se vai produzir solidariedade entre os povos. O que vamos presenciar no Brasil nesses eventos esportivos é a expressão máxima de suplício da vida humana de forma espetacularizada pela mídia. Então, não interessa nem no ponto de vista dos esportes. Nós no Brasil, ao contrário do que a mídia divulga, deveríamos nos orgulhar de não ter tantos atletas olímpicos quanto à elite brasileira deseja. Porque a forma de produzir um atleta olímpico é de um para um milhão de pessoas, como foi pesquisado nos anos 1970. Deste jeito só há exclusão, se destrói a vida das pessoas para produzir um atleta olímpico. Esse atleta é destruído pela máquina econômica (Copa e Olimpíada), ele é uma das expressões biológicas mais raras da espécie humana. Essa expressão biológica não deveria participar de eventos e competições comandadas por mãos e cérebros tão danificadores, como esses que aportaram aqui no Brasil. O meu sonho como professor de Educação Física é que em algum momento tenhamos uma Copa do Mundo solidária de futebol, com jogos olimpicamente fraternos entre os povos. Daí que nós pratiquemos de forma fraternal muitas atividades corporais.

André Lobão: Se esperava muito desse atual governo uma melhora na gestão do esporte no Brasil, não é?

Paulo Capela: O que me entristece muito é a não possibilidade de operar isso no ambiente de poder. Logo com um governo de esquerda nesse mesmo poder, no qual estão os principais pesquisadores da educação física que produziram uma tecnologia de qualidade. Eles não pensaram esse modelo Copa do Mundo – Olimpíada, que funciona na base do superfaturamento, que é na verdade um saque econômico. Não é isso que os idealizadores (Jules Rimet e Barão de Coubertin) da Copa e da Olimpíada pensaram ou imaginaram, definitivamente não é. O que discutimos são as dimensões inumanas do desporto. De uma Copa do Mundo e uma Olimpíada, de como elas começaram a serem formatadas a partir dos anos 1990, elas perderam totalmente o sentido de confraternização dos povos. É eminentemente um produto de mercado, e como mercadoria alguém tem que pagar. E aí começa toda essa engrenagem econômica que corrói os estados e investimentos nacionais, infelizmente.

Para quem quiser, pode conferir a página da entrevista no seguinte link: Lobotomia e Comunicação - Copa do Mundo e Olimpíada: Os cartéis mandam no jogo

MARACANÃ E OS DONOS DO RIO

Segue o vídeo e a entrevista de rádio, cuja o Professor Paulo Capela, o coordenador do GECUPOM, participou. Trata-se de um documentário sobre as obras da COPA 2014 e suas relações com as empreiteiras e autoridades públicas. Foi produzido pelo grupo que coordena muitas ações no Rio de Janeiro através da mobilização popular e das rádios comunitárias.

Vídeo - Maracanã e os donos do rio

Versão Rádio - Participação Paulo Capela

Visita de estudos ao E.C. Criciúma

Em cumprimento à programação do semestre vigente, o GECUPOM fez uma visita de estudos ao Esporte Clube Criciúma. Todas as informações coletadas por meio de áudio, vídeo e notas serão editados e publicadas no blog nas próximas semanas.

GECUPOM entrevista o preparador físico Márcio Corrêa

O Grupo de Estudos em Cultura Popular e de Movimento (GECUPOM) entrevistou o preparador físico Márcio Corrêa, que estava no Clube América Mineiro e recentemente assumiu o desafio de tentar manter o Criciúma na elite do futebol brasileiro.
Confira abaixo o link da entrevista.

https://www.youtube.com/watch?v=hiQxeGEMy6k


A Copa do Capital



Em entrevista a revista Previsão, o Professor Paulo Ricardo do Canto Capela fala sobre os megaeventos esportivos e suas implicações populares.
Por Marcela Cornelli - Jornalista do Sindrepsv/SC

Faltaria espaço para tratarmos de todos os aspectos que envolvem a realização dos megaeventos esportivos no Brasil, mas vamos tentar levantar alguns pontos de reflexão sobre o assunto. Começando com a Copa das Confederações em julho deste ano, a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016 o Brasil sediará megaeventos esportivos que já estão afetando à população brasileira, principalmente as comunidades empobrecidas. Estima-se, nas primeiras análises, que 170 mil pessoas terão seus direitos à moradia violados. Os números verdadeiros se saberá com o tempo e tendem a ser maiores. Em um País com um déficit habitacional de 5.500.000 moradias e 15.000.000 de domicílios urbanos sem condições mínimas de habitabilidade (saneamento, infraestrutura urbana, etc.), segundo dossiê elaborado pela Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa, e a precariedade e descaso que são tratadas a saúde deveríamos ter o direito de decidir onde o dinheiro público deveria ser aplicado e com certeza não seria nos megaeventos esportivos que em nada beneficiarão a população e sim darão lucros às empreiteiras e aos donos do capital.
De acordo com o dossiê, Odebrecht, Camargo Correia, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, OAS, Delta e Galvão Engenharia estão participando da construção de estádios para a Copa. Estas empresas são provavelmente as maiores financiadoras de campanhas eleitorais milionárias no Brasil. E o que dizer da Lei da Copa (Lei número 12.035/2009) que fere a Constituição do País? Institui exigências como a meia-entrada de idosos e estudantes apenas na categoria popular, o mais barato, permissão para criação das Zonas de exclusão, com restrição ao comércio de rua e à circulação de pessoas em um raio de dois quilômetros dos estádios, privatização e exclusividade da exploração de símbolos da seleção brasileira e do Brasil, proibição de aulas nas redes do ensino público e privado durante a Copa, criação de crimes especiais e sanções civis para reserva de mercado, publicidade e propaganda, limitações à captação e transmissão de imagem e som, responsabilidade geral do Estado por quaisquer danos e prejuízos com segurança, levando a União a indenizar a Fifa, a criação de Juizados Especais e da Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos, Decreto n. 7.536 2011. Tudo isso preocupa e fere a liberdade do nosso povo. Também o PL 728/2011 que tramita no Congresso para coibir o direito a greve durante a Copa (Leia mais nas págs centrais).
“Os megaeventos esportivos afetarão a população Brasileira da forma mais danosa possível, estão sendo gastos valores exorbitantes numa parceria do Estado brasileiro e as elites nacionais com a perspectiva de reposicionar em território nacional um programa cultural, econômico e de esporte e lazer que não interessa ao povo brasileiro”, defende o professor Paulo Ricardo do Canto Capela, professor do Departamento de Educação Física da Universidade Federal de Santa Catarina.
“Os megaeventos esportivos em sua estrutura, a qual foi aceita em sua forma integral pelo governo Lula e continua sendo aceita de forma dócil pelos congressistas, constrói o que se convencionou chamar de cidade de exceção que permite alterar os Planos Diretores estabelecidos em plenárias populares, conforme estabelece o Estatuto das Cidades. Através desse instrumento “legal” e o uso da força policial são removidas famílias de forma desumana, ilegal e arbitrária, a pedido da Fifa e COI (Comitê Olímpico Internacional). São ações de interesse da especulação imobiliária, hotelaria de luxo e das grandes empreiteiras. O Estado brasileiro está proporcionando aos grandes especuladores e as elites esportivas nacionais o que eles sempre quiseram, e até mais do que sempre esperavam ter”, afirma o professor.
Santa Catarina não sediará nenhum evento, mas sua população também será afetada. Na opinião do professor Paulo Capela. “está em curso no Estado uma série de ações e “conquista” de verbas públicas para as construções de equipamentos de esporte e lazer, obras de ampliação da capacidade da hotelaria de luxo; obras de infraestrutura; além de infindáveis cursos de formação de mão de obra alienada para trabalhar, sem qualquer questionamento crítico durante esses eventos. São ações que trarão sérias consequências, tanto culturais quanto econômicas, além dos recursos públicos
que estão sendo empregados nessas ações poderem ter sido direcionados para atender históricas demandas populares. São obras e ações definidas através de acordos de gabinete, longe do bom debate democrático e público-popular. O que o Estado de SC “conquistará” será por conveniência das mesmas velhas e carcomidas elites empresarias, esportivas, em acordo com as também velhas elites políticas de Santa Catarina”, analisa o professor.
Capela observa que encontram-se em fase adiantada de aprovação duas pistas Olímpicas de atletismo (uma em Florianópolis na UFSC e outra em Chapecó) sem qualquer estudo, debate público, ou sustentação teórico-conceitual sobre ser ou não apropriado tais equipamentos para o desenvolvimento esportivo dos municípios e para o estado de Santa Catarina. Também estão sendo realizados muitos cursos de formação profissional atrelados ao “calendário dos megaeventos esportivos” que em nada modificarão as possibilidades de esclarecimento sobre os megaeventos esportivos, a garantia de condições dignas para atletas e técnicos do esporte de alto-rendimento e nem para a democratização do esporte e lazer das populações de não atletas. Também não contribuirá para a melhoria da empregabilidade dos trabalhadores no Estado.
São ações movidas apenas por interesses em captar verbas públicas disponíveis e para crescer o empoderamento das tradicionais elites do Estado”, afirma.
Segundo o professor, para se opor a este modelo elitista de esporte, em Santa Catarina está se construindo uma rede de articulação com intelectuais, artistas, movimentos sociais, sindicalistas, atletas e universidades apoiadoras, no sentido de organizar um grande movimento pela democratização do esporte e lazer no Estado. “Esses agentes precisam ter voz na construção de um novo modelo de esporte e lazer, um modelo de caráter popular. O grande empecilho para termos um sistema esportivo de qualidade referenciado nas demandas populares aqui no Estado e no país não é falta de dinheiro, mas sim de vontade política dos que sempre mandaram no esporte e no Estado em nosso país”.
Paixão nacional?
Na opinião do professor, os megaeventos esportivos não tem qualquer relação direta com a melhoria da prática esportiva ou de vida do povo brasileiro. “São apenas negócios e uma grande ação de neocolonização cultural e econômica de nosso país e continente, produzirão mais do mesmo, ou seja, o desenvolvimento do sub-desenvolvimento econômico, esportivo e cultural, e é claro, muitos ganhos econômicos para poucos. Quem ganha são as elites empresarias, esportivas, mídia oficial e a indústria cultural do entretenimento, e quem perde é como sempre o povo simples e sofrido, os trabalhadores e seus filhos e todos aqueles que trabalham para a consolidação de um projeto nacional--popular para o Brasil”, finaliza.

Fatos sobre a Copa no Brasil


Segue um vídeo... opinião interessante do Jornalista Luiz Carlos Prates sobre a Copa do Mundo e os Estádios da Copa.

Dos onze jogadores do Gaúcho, sobraram apenas três

Zé Augusto e Luiz Freire não tomavam injetáveis. Luiz Carlos tratou a hepatite e sobreviveu

 Dos onze jogadores do Gaúcho, sobraram apenas três Luis Iarcheski , Reprodução/

Alguém avisava sorrateiro no vestiário do Estádio Wolmar Salton, nos anos 70:
– Hora da amarelinha.
Quase todos os jogadores do Gaúcho de Passo Fundo esticavam o braço com a mão fechada e faziam saltar a veia à espera que o enfermeiro lhes aplicasse injeções de vitaminas ou de estimulantes, dependendo do dia. A um canto, o fogareiro aquecia o estojo de metal com água ou álcool fervente dentro do qual boiava a seringa de vidro. O enfermeiro aplicava uma dose, mergulhava a seringa no estojo, catava-a com a pinça e logo a injetava em outro. Era rotineiro.
Quase todos os clubes pequenos e médios do Estado e do país procediam assim.
Ampolas de líquido amarelo de Glucoenergan, na verdade, não passavam de glicose. O time corria mais, ou nem tanto. As aplicações eram de efeito mais sugestivo do que real. Nem eram consideradas doping. Os médicos não recomendavam aquelas agulhadas. Alguns até as proibiam. Mas o enfermeiro do clube fazia infiltrações musculares, ministrava vitaminas e, de quebra, ainda aplicava a glicose. Por vezes, uma dose de 50 mililitros era administrada em cinco braços. Na crença de que eram todos sadios no vestiário, não viam mal nisso.
Ao ferver a água no fogareiro, o responsável pelas injeções tomava a precaução normal da época contra bactérias, viroses, infecções e doenças venéreas, o maior temor daqueles dias. A fervura atingia 100ºC no fogareiro e de nada adiantava, porque são necessários 150ºC para destruir o vírus. Ninguém sabia do inimigo oculto e letal que permanecia vivo no cilindro de vidro e na agulha. A ciência só identificaria o agente da hepatite C em 1989. Até então, a seringa era uma só no vestiário.
A contaminação pelo sangue acabou se tornando um flagelo no país e patrocinou tragédias ao longo dos últimos 30 anos. Um dos primeiros a cair pela hepatite C em Passo Fundo foi o ex-goleiro Carlos Alberto, em meados dos anos 1980, com pouco mais de 30 anos de idade. Os últimos foram os pontas Leivinha e Serginho, no ano passado.
A cultura dos estimulantes granjeou pelo Interior entre os anos 1960 e 1980. Mas em nenhum outro clube do Estado foi tão mortal como em Passo Fundo, no Gaúcho. Como o vírus resulta em cirrose e câncer do fígado num período de 20 a 40 anos depois da contaminação, ainda hoje há gente morrendo ou se adoentando em consequência das agulhas da década de 1970.
Dos 11 titulares de uma formação tradicional do Gaúcho, de 1973, passados 40 anos, apenas três estão vivos. Restam os meias Luiz Freire e seu irmão Zé Augusto e o lateral-esquerdo Luiz Carlos. Os demais foram abatidos por complicações decorrentes da hepatite C, como aconteceu com o centroavante Bebeto, conhecido como o Canhão da Serra, um dos maiores goleadores do futebol gaúcho.
Da cruenta dupla de zaga dos Pontes, o central João, irmão de Daizon, não resistiu à herança do vírus. Reservas, os zagueiros Lívio e Raul Santos também foram abatidos pela hepatite.
De cada time do Gaúcho dos anos 1970 é possível identificar dois ou três mortos tendo como base a mesma causa virótica. A estatística macabra na cidade se intensificou nos últimos três anos. Desde 2010, já são 17 os remanescentes que acabaram derrubados pelo vírus HCV. Eram profissionais do Gaúcho e do 14 de Julho, o outro clube da cidade.
A relação dos mortos recentes tem Marquinhos, Laerte, Mosquito, Mica, Ilo, Lívio, Téio, Pedro, Raul Matté, Marianinho, Machado, Ivan, Cid, Tadeu Bauru, Serginho e Leivinha. Até o massagista Pinto caiu por hepatite.
Ninguém sabe o número completo das vítimas, desde 1980. Muitos saíram da cidade.
– Muita gente morreu. Muita gente vai morrer – alerta o ex-meia e hoje técnico Luiz Freire, outro mito que fez nome no Gaúcho, no Caxias, no Inter, Grêmio, Brasil-Pel e Coritiba.
No dia 22 de abril, Luiz Freire encontrou em Passo Fundo seu antigo colega Luiz Carlos. Não se viam havia anos.
Foi um reencontro emotivo.
– O Leivinha morreu, não é? Fiquei sabendo há pouco – comentou Luiz Freire.
– Pois é. Se foi mais um dos nossos. Cada um que vai (morre) deixa um clima ruim entre nós – respondeu Luiz Carlos, melancólico.
– Os caras acham que não têm nada, evitam o médico, e a doença é silenciosa e vai longe – lamentou o ex-meia.
Luiz Freire, 60 anos, sabe o que diz. Ele e Zé Augusto jamais se injetaram com estimulantes. Aprenderam com o avô. Seu Arnoldo Ellwanger, farmacêutico, ensinava-lhes a rejeitar seringas que não fossem as de casa. Aos 14 anos, Luiz Freire já sabia fazer aplicações. Começou profissional no Gaúcho em 1971 e, um ano depois, entrou na faculdade de Medicina.
Sempre que via o enfermeiro no vestiário, advertia os colegas sobre as seringas compartilhadas. Não era ouvido.
Luiz Carlos não dava atenção ao amigo. Seguia tomando a glicose porque os demais jogadores estavam lá, eles tinham de passar por cima do adversário em campo e, afinal, o regulamento permitia.
– Meu negócio era a Tiaminose, tomava quase sempre. Só não aplicava a gluco (Glucoenergan) – admitiu Luiz Carlos.
Ex-lateral esquerdo, duro marcador de Valdomiro, Flecha e Tarciso, Luiz Carlos relutou em se submeter ao teste para o vírus HCV. Quem o dobrou foi um antigo atacante do Gaúcho. Roberto Antonello tratou a sua hepatite e se dedicou a persuadir os colegas a fazer o exame. Andava pelo Interior vendendo seguros e aconselhando antigos jogadores.
– O Roberto salvou minha vida. Por causa dele, fiz o teste para hepatite. Deve ter salvo muita gente pelo Estado – disse Luiz Carlos.
O terceiro sobrevivente do time de 1973 mora hoje em Santo Antônio da Patrulha. José Augusto Freire, como o irmão, era dos mais novos do grupo do Gaúcho. Além dos conselhos do avô Arnoldo vivos na cabeça, não via muita necessidade em tomar glicose injetável para correr.
– O nosso preparador era dos melhores, da Universidade de Passo Fundo. Fazia a gente correr – explicou Zé Augusto.
Corriam na cidade, pela estrada, no asfalto, e puxavam pneu na caixa de areia.
Havia um 12º jogador daquele time. Chamava-se João Francisco Guimarães, o Paraná. Há muito havia deixado Passo Fundo. Ninguém sabia dele, e já constava do placar dos mortos montado nos bate-papos da Praça Central.
Mas Paraná era mais esperto do que imaginavam. Na hora da aplicação com a letal seringa de vidro, em meio à euforia dos vamos lá, ele dava um jeito na situação.
– Eu pegava uma ampola, dizia que ia tomar na farmácia, deixava o vestiário e colocava tudo no lixo – contou.
Paraná corria muito. Tinha um preparo físico avantajado. Esnobava os estimulantes, assim como os irmãos Freire.
Em algumas manhãs de domingos de jogos à tarde, o grupo assistia à missa na catedral. No caminho de volta à concentração no estádio, os jogadores passavam na salinha que o enfermeiro do clube mantinha no centro de Passo Fundo. Tomavam as injeções e se recolhiam à espera da partida. Paraná era dos poucos que não entravam na saleta. Passava reto.
O enfermeiro atendia o time do Gaúcho e a Samdu, antigo Serviço de Assistência Médica Domiciliar e de Urgência. Na salinha, fazia aplicações em quem o procurasse e dali saía a domicílio. Orgulhava-se do seu conjunto de 22 agulhas de aço, as peças com as quais infectou inocentemente grande parte de Passo Fundo.