Quando nos reunimos para decidir quais pontos levaríamos à audiência do Bom Senso com a presidente Dilma Rousseff na próxima segunda-feira (21), a dúvida era saber em que o governo teria agilidade e autonomia para efetuar uma mudança importante. Sabíamos que estatizar o futebol não era, nem de perto, a solução para os nossos problemas.
A maioria das nossas questões sempre emperrou na CBF e em sua má vontade em desenvolver políticas e regulamentos que otimizem a evolução do esporte no país. Aliás, a própria CBF, numa tática de guerra conhecida como deterrência ou "teoria da intimidação", controla seus 47 membros que votam —20 clubes da série A e 27 federações estaduais— explorando, de forma quase ditatorial, um bem público por intermédio de uma entidade privada e dificultando a alternância de poder e o acesso de novas pessoas. Assim, concluímos que, maior do que as demandas do nosso movimento e da nossa categoria, democratizar a entidade é questão vital para que se reconstrua o verdadeiro futebol brasileiro.
Mas como o Congresso Nacional poderia intervir para promover a modernização ou a regulamentação das atividades da CBF que, apesar de arrecadar mais de R$ 400 milhões por ano com a "exploração" da nossa seleção, se ampara no artigo 217 da Constituição, inciso I, que define que as entidades que administram o esporte no país têm autonomia financeira e estatutária?
Nas últimas semanas, antes da derrota brasileira, os grandes clubes de futebol fizeram lobby por uma audiência com a presidente Dilma para pedir que o projeto de Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte (LRFE) seja aprovado com urgência.
O projeto propõe o parcelamento da dívida fiscal dos clubes, mas oculta, sagazmente, a isenção da responsabilidade civil e penal dos dirigentes que cometeram irregularidades. A mencionada dívida decorre do Imposto de Renda e da contribuição à Previdência retida do atleta e não repassadas à União, ou seja, apropriação indébita, crime. Além disso, o projeto é frágil ao tentar garantir que os clubes estejam realmente em dia com suas obrigações fiscais e, principalmente, trabalhistas.
Essa debilidade justifica o desespero dos dirigentes e a pressão da "bancada da bola" para sua rápida aprovação, já que, uma vez garantido o parcelamento, clubes e CBF voltarão a se blindar e não mais discutirão as mudanças estruturais.
Em miúdos, os clubes estão nas mãos da presidente, do Congresso, do parcelamento dos R$ 5 bilhões da dívida. E a tão temida e outrora intocável CBF está nas mãos dos "quebrados" clubes, que, para sobreviver, farão o que for preciso, inclusive peitar a CBF.
O Bom Senso se antecipou e, no encontro anterior com a presidente, em maio, fez um apelo: "Não aprove a LRFE do jeito que está. É preciso aproveitar a oportunidade e exigir dos clubes, em contrapartida pelo parcelamento da dívida (dinheiro público), a regulação e a democratização do estatuto da CBF, limitando o mandato dos dirigentes a quatro anos com apenas uma recondução, dando voz e direito de voto aos atletas, treinadores, árbitros e demais clubes filiados à entidade. Essa diversidade permitirá abordar todas as dimensões e interesses do futebol brasileiro".
Este é o ponto da virada, tornar a entidade mais transparente, com uma visão ampla, menos política e mais técnica. Responsável por investir maciçamente na capacitação de treinadores e gestores, desenvolver licenças e métodos da "escola brasileira" de futebol, investir e profissionalizar o futebol feminino e o futebol de areia, debater e implantar o novo calendário e o verdadeiro Jogo Limpo Financeiro, cujo objetivo não será punir os clubes, mas defender e proteger o nosso futebol.
Essa partida está na prorrogação. Os clubes, a CBF e a bancada da bola estão no ataque. Nosso time conta com você para virar esse jogo.
PAULO ANDRÉ, 30, jogador de futebol, é fundador e um dos líderes do Bom Senso Futebol Clube, associação dedicada a promover reformulações no esporte.
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