Papai Noel espanhol
Por Guilherme Costa - Universidade do Futebol
Bayern deu uma aula de comunicação ao contratar Guardiola. Guardiola tem dado aulas de comunicação ao transformar o estilo e a postura do Bayern
24/12/2013
Thiago Alcântara é filho de brasileiro, mas nasceu na Itália e defende a seleção da Espanha, país em que se formou como jogador de futebol. Defende atualmente um time alemão, o Bayern de Munique, que conquistou no último sábado, no Marrocos, o título mundial de clubes da Fifa. Primogênito de Mazinho, campeão da Copa de 1994, o camisa 6 é um resumo da globalização do futebol atual. Mas também é uma aula constante de vários conceitos que nós discutimos por aqui durante o ano.
Contratado para esta temporada, Thiago Alcântara fez um movimento curioso. Deixou o Barcelona, time em que era uma das maiores apostas para o futuro. Deixou um ambiente que ele conhecia e dominava desde as categorias de base. Deixou uma torcida afeiçoada ao estilo de jogo dele.
A adição de Thiago ao elenco do Bayern de Munique, que havia conquistado na temporada anterior a Copa da Alemanha, o Campeonato Alemão e a Liga dos Campeões da Uefa, foi um pedido de Pep Guardiola, espanhol que assumiu o time exatamente depois da tríplice coroa.
Assim como Thiago, Guardiola é egresso do Barcelona. Ambos foram formados de acordo com a filosofia de jogo do time catalão. Ambos veem futebol como o time espanhol os acostumou a enxergar.
O Bayern não contratou Guardiola apenas para ter sucesso esportivo. Para isso, seria mais simples manter o time vencedor, veloz e mortal da temporada passada. A equipe alemã percorria caminhos mais curtos para as vitórias.
A contratação de Guardiola tem a ver com a mensagem que o Bayern de Munique quer transmitir. Mais do que vencer, o time alemão assumiu o desafio de assimilar a filosofia do treinador: controle do jogo, domínio da bola e encantamento produzido pelo coletivo.
O Bayern de Munique não se tornou no Marrocos o melhor time do mundo. Os alemães são os melhores do mundo desde o término da temporada passada.
Aí começam a entrar alguns conceitos fundamentais de comunicação. Em primeiro lugar, a visão da diretoria da equipe alemã: o Bayern não se acomodou e não se contentou com o êxito. A cúpula quis construir um time que transmitisse mensagens e que produzisse um impacto em quem vê. Hoje em dia, é impossível passar incólume por um jogo dos bávaros.
Outro ponto é a postura de Guardiola. O treinador foi questionado no início, até mesmo por jogadores. Bastian Schweinsteiger chegou a dizer que não sabia em que posição ele atuava.
Guardiola montou um Bayern que joga no 4-1-4-1 na maior parte do tempo, mas que tem liberdade. E é extremamente complicado convencer um jogador de futebol a aproveitar a liberdade.
Num esporte mecanizado, moldado desde cedo por conceitos tecnicistas, jogadores não costumam pensar. Resolvem problemas, mas fazem isso de forma empírica. Improvisam, mas fazem isso por pura necessidade.
O Bayern de Guardiola subverte isso. É um time que controla a bola, que usa uma movimentação intensa e que oferece liberdade para os jogadores. São conceitos simples, mas extremamente raros.
Guardiola merece um elogio a mais. O treinador pode não vencer nada, mas em momento algum abriu mão de suas convicções. Montou o Bayern com características que ele havia impingido ao Barcelona. O time alemão lidera com folga a Bundesliga e se classificou com facilidade para a fase decisiva da Liga dos Campeões da Uefa.
Aqui é fundamental uma lembrança: um treinador novato, que tinha apenas uma experiência na profissão, precisou convencer a equipe que tinha vencido tudo na temporada anterior a mudar tudo. Ele precisou mostrar a um grupo inteiro que vencer não era tudo.
O Bayern deu uma aula de comunicação ao contratar Guardiola. Guardiola tem dado aulas de comunicação ao transformar o estilo e a postura do Bayern.
E onde entra o meio-campista Thiago Alcântara nessa discussão?
Thiago simboliza o que Guardiola pensa de futebol. É um jogador refinado, que toca a bola sem pressa e que tem autossuficiência. Ele sabe o quanto domina o jogo, o que o ajuda a ousar em passes e finalizações.
É difícil dizer a posição de Thiago Alcântara. Ele não é um volante, tampouco um meia. É um armador, mas um armador que atua sempre de frente para o jogo.
No Brasil, Thiago provavelmente teria de escolher entre as duas opções. Teria de se acostumar a jogar de costas para o gol, protegendo a bola até o time se movimentar, como fazem os meias. Ou então marcar, fechar espaços nas laterais e reduzir as investidas ao ataque, como fazem os volantes.
Ele não escolheu nenhuma das coisas. Escolheu ser um armador que percorre a zona intermediária do campo, assim como Xavi. Dono do passe mais perfeito do futebol mundial há muitos anos, o espanhol é subvalorizado porque não é um goleador ou um definidor de lances. Mas ele é a principal razão de o Barcelona e a seleção espanhola terem o perfil que têm.
A visão de futebol de Thiago é moderna e extremamente alinhada ao que Guardiola preconiza.
Aí está mais uma lição de comunicação do Bayern: o time tem objetivos claros, que são construídos por pessoas que estão alinhadas a essas estratégias.
Repito: o time alemão pode não vencer tanto quanto o anterior. Futebol, afinal, é um jogo.
Independentemente disso, porém, o Bayern já atingiu feitos nesta temporada. Na comunicação, principalmente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário