O ensino dos desportos coletivos


Autor: Lucas Barreto Klein 
Resenha do livro: BAYER, Claude. O ensino dos desportos colectivos. Lisboa: Dinalivro, 1994.

INTRODUÇÃO
            Esta obra tem como objetivo buscar uma aproximação entre a dialética existente nas relações de teoria e prática, que na educação física e na pedagogia esportiva dos jogos coletivos, ainda encontra-se muito distante. Além disso, visa apresentar conceitos que superem uma mera reprodução do desporto de alto rendimento na iniciação esportiva, pois os chamados “princípios operacionais” existentes em todas as modalidades coletivas é que irão regular as atitudes e comportamentos de cada aluno, buscando desenvolver e melhorar variados domínios tais como a inteligência, motricidade, afetividade e muitos outros.

PRIMEIRA PARTE – BASES DUMA EXPERIÊNCIA

1. O transfert
O transfert é definido como o transporte de aprendizagem existente entre uma atividade e outra, ou seja, existe um transfert da aprendizagem sempre que uma atividade modifica outra.
Tipos de transfert:
- Pró-ativo: a atividade anterior modifica a aprendizagem presente
      - Retroativo: a aprendizagem atual modifica os hábitos adquiridos anteriormente

            O conceito determinado pela transferência de aprendizagem nas atividades é bastante discutido no mundo filosófico, e ele pode atuar também como um fator determinante nas escolhas das atividades propostas pelos professores em suas aulas, portanto, a seguir serão apresentados as diferentes teorias do transfert da aprendizagem, do ponto de vista associacionista, globalista e fenômeno-estrutural.

  • Associacionista: Está é uma corrente que busca lidar com exercícios de cunho analítico, tratando elementos afastados do contexto da realidade do movimento, pedagogicamente busca-se retirar as atividades de sua totalidade, acreditando-se que a soma das partes formará um todo efetivo, através da transferência dum exercício a outro.
  • Globalista: Busca uma oposição ao pensamento fragmentado, trabalha-se o todo, onde o aluno que deverá encontrar as soluções para os problemas impostos pelo jogo. Do ponto de vista pedagógico, esta teoria parece muito rica, porém, a pouca variabilidade de situações propostas pelo professor acaba provocando uma estagnação motora dos alunos, pois a partir do momento que o problema do jogo é resolvido não existem mais desafios.
  • Fenômeno-estrutural: Esta teoria não rejeita as anteriores, mas encara as estruturas de uma maneira dinâmica. O fundamental neste pensamento é que o sujeito é quem dará sentido as estruturas com o objetivo de modificá-las, buscando que cada indivíduo possa agir a partir de sua experiência (transfert) na construção de seu ato motor.
 2. Análise estrutural dos desportos coletivos
            Os esportes coletivos têm suas origens nas tradições mais primitivas da sociedade, onde diversos jogos com bola já faziam parte das culturas locais, porém somente no início do século XIX foram constituídos os primeiros registros destas práticas.
            Todas as modalidades coletivas possuem algumas características semelhantes que fazem elas se aproximarem, criando assim as bases de todos os esportes coletivos conhecidos hoje, entre eles, temos o objeto esférico (bola) jogado com as mãos ou com os pés, um terreno demarcado, podendo ser grande ou pequeno, um alvo a atacar ou a defender, variando de acordo com os objetivos dos jogos (parede, círculos, balizas, rede e outros), os parceiros da equipe que ajudam na progressão da bola, os adversários a serem derrotados e as regras a serem respeitadas, estas regras poderiam ainda sofrer variações do mesmo jogo, dependendo da região em que era praticada.
            Esses princípios ocorrem basicamente em duas situações, a primeira é quando a minha equipe possui a posse de bola, portanto sou atacante e devo: conservá-la, progredir com ela, e com meus companheiros, em direção a baliza adversária com o objetivo de marcar o gol, em outra situação, em que a posse de bola esta com o adversário, automaticamente eu me torno defensor e os objetivos se tornam opostos, sendo eles: recuperar a posse da bola, impedir a progressão dos jogadores e da bola para a minha baliza e criar uma proteção no meu campo de jogo impedindo o gol do adversário, desta forma o futsal é fortemente caracterizado como uma constante dialética entre ataque e defesa.

3. Para uma experiência pedagógica
            O desporto coletivo representa uma atividade social e cultural, desta forma, agindo como um excelente meio de educação.
            Ao nível de aprendizagem desenvolveram-se duas grandes correntes pedagógicas: o método tradicional e o método ativo (global). Estas correntes opostas possuem diferentes formas de interpretar o ensino.
            Ainda dentro do ponto de vista pedagógico é possível citar algumas abordagens que influenciaram as didáticas atuantes nos desportos coletivos: abordagem mecanicista, abordagem baseada nas combinações de jogo, abordagem dialética e abordagem centrada na pedagogia das situações.
            O autor da um destaque para uma “pedagogia das intenções” (inspiração fenomenológica) que traz a revalorização do aluno enquanto ser que age, enquanto produtor do seu jogo e construtor do seu futuro, e o método estrutural, desenvolvido através da lógica interna dos jogos (fenômeno-estrutural), cujo objetivo é proporcionar uma prática transferível entre as diversas modalidades a partir das noções táticas individuais e coletivas, sempre se respeitando as características de cada grupo, indivíduo e categorias.

SEGUNDA PARTE – A FORMAÇÃO TÁTICA INDIVIDUAL

4. A defesa
            A defesa começa no exato momento em que a equipe perde a posse da bola, logo, os principais objetivos dela são: a recuperação da bola, impedir a progressão do adversário e proteger a baliza.
            O ato de defender é caracterizado pelas seguintes regras de ação: ser ativo, agir com continuidade e apresentar ajuda (apoio/cobertura).
            Para se construir os aspectos defensivos individuais e posteriormente a defesa coletiva deve-se trabalhar em desenvolvimento a partir da igualdade, superioridade e inferioridade numérica em situações de jogo (próximos do real).

5. O ataque
            Assim como a defesa, o ataque possui princípios que determinam a sua ação, são eles: conservação da bola, progressão e realização do ponto (gol).
            É importante chamar a atenção para que os alunos sejam capazes de perceber a posição da bola, os espaços livres (desmarcação), a situação dos companheiros e a realização da chamada da bola.
            Para se construir os aspectos ofensivos individuais e posteriormente o ataque coletivo deve-se trabalhar em desenvolvimento a partir de situações de superioridade e igualdade numérica em situações de jogo (próximos do real).

6. A didática
            A didática visa à organização sistemática dos conteúdos do ensino, e ela deve ser organizada a partir da lógica interna de cada modalidade, dos princípios operacionaisregras de ação de cada atividade. (ataque e defesa) e das
            O motor que irá conduzir o processo didático está diretamente relacionado na dialética existente entre ataque e defesa, que é característico dos jogos coletivos.
            Desta forma, o autor demonstra que uma opção fenômeno-estrutural, no quadro de uma pedagogia das intenções, alcança o objetivo de desenvolver uma prática transferível pela criança, realizado por ela própria, desta forma colocando o aluno como foco central do processo de ensino-aprendizagem.

TERCEIRA PARTE – OUTROS ASPECTOS DA ATIVIDADE

7. A motricidade
            A motricidade é definida como um pré-requisito ao gesto técnico, portanto deve-se trabalhar uma motricidade rica e diversificada para a criança, para mais tarde especializá-la no gesto desportivo.
            O desenvolvimento da motricidade geral passa pelos seguintes passos: aquisição da coordenação dinâmica geral, estruturação espaço-temporal, descontração dos músculos não necessários para a ação, equilíbrio dinâmico, ritmo e visão de jogo (desprender-se do olhar centrado na bola), o autor chama a atenção para a motricidade aquática, que engloba esta motricidade geral, porém, possui especificidades de desenvolvimentos através dos nados.

8. A preparação física
            Para o desenvolvimento das qualidades físicas é preciso conhecer as características maturacionais de cada indivíduo praticante da modalidade, isto se torna “padronizado” através das divisões em faixas etárias (idade cronológica).
            Existem diversos meios para desenvolver as capacidades de resistência, velocidade, flexibilidade e força, o autor defende que para se realizar um trabalho qualitativo é preciso compreender as questões fisiológicas do exercício, e utilizar estes volumes e intensidades de uma forma específica, ou seja, através de jogos que proporcionem uma melhora técnico/tática, além de desenvolver o condicionamento físico desejado, além desta proposta, o autor apresenta diversas abordagens de trabalho puramente físico (sem bola).

9. A dinâmica da equipe
            Para a construção da dinâmica de uma equipe o autor apresenta como fatores determinantes: o conhecimento da personalidade de seus alunos e uma relação afetiva e respeitosa entre alunos e professores, para desta forma criar um ambiente pedagógico saudável que possibilite uma formação/educação de qualidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
            Os desportos coletivos agem enquanto atividades teórico/práticas, proporcionando riquezas incontestáveis, e no plano educativo ajuda a desenvolver no aperfeiçoamento das capacidades físicas, aperfeiçoamento do complexo perceptivo-motor, melhoria no sentido tático a partir dos princípios operacionais. Através de uma formação universal ele busca combater as especializações precoces, e num plano geral, ajuda na formação da consciência de certas necessidades e dos fenômenos inerentes ao convívio social.
            As idéias do autor passam basicamente pelo fato do processo de aprendizagem estar focado no sujeito (aluno), trazendo ele para dentro dos princípios inerentes a prática esportiva, de forma com que este aluno possa compreender a lógica do jogo, e agir conforme as situações vividas, de forma intencional, e não mecânica.

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